Quantas versões de nós cabem em um mesmo ano? Nos últimos meses e, principalmente, nos dois anos anteriores, tenho sentido uma mudança que continua em movimento tanto na forma de ver o que me rodeia quanto de me enxergar por dentro.
A pandemia acelerou diversas coisas e, conforme os dias foram se moldando às circunstâncias, senti que a velha roupa que eu usava já precisava ser outra. O que estava no meu guarda-roupa não me servia mais, como Belchior já dizia: “no presente a mente, o corpo é diferente”.
Essas mudanças vieram de tantas formas, permeando não somente o vestuário, mas as bebidas e refeições, o jeito de pensar a rotina, o hábito de escrita e leitura, a organização dos móveis do quarto, enfim, uma série de coisas que tem se transformado por aqui. Por aí também tem sido assim?
Algumas pessoas nomeiam esse período de retorno de Saturno, visto que faço 30 em janeiro, mas talvez seja mesmo uma necessidade de encontrar o que realmente me faz bem. Um jeito de experimentar, com cuidado, outras coisas a partir da curiosidade de me entender mais e traçar um horizonte mais bonito para os próximos anos.
Entre tantas mudanças, tenho procurado um meio de criar um abrigo para que eu não me sinta “dentro” nem “fora”, um lugar para onde eu possa voltar quando estiver exausta ou precisando minimamente de alguma dose de esperança para continuar tentando. Um espaço-tempo que me permita ter a sensação de segurança enquanto a casa estiver em reforma.
Até onde você pode ir para aceitar suas mudanças, aceitar os fluxos da vida e continuar se reconhecendo como um ser que experimenta coisas novas nesse constante ir e vir?
Algumas das coisas mais marcantes dos últimos dois anos foi ter feito uma consultoria de estilo e mudado o meu quarto por diversas vezes. A consultoria, que fiz com a Clara Rocha, me abriu os olhos para me ver de um jeito que eu nem imaginava. Com a Clarinha, umas das coisas mais lindas que aprendi foi que minhas roupas podem me ajudar a contar a minha história, e isso tem sido um processo lento e muito importante. Tem mudança que leva tempo mesmo, e é importante respeitar esses pequenos passos.
O meu quarto tem sido o cantinho onde passo a maior parte dos meus dias e, tendo percebido algumas mudanças internas, naturalmente quis modificá-lo também. Algumas vezes o que a gente movimenta por dentro tem a necessidade de se expandir para se tornar mais visível. Pintei as paredes dele de outras cores com minha mãe, mudei a mesa de lugar, depois mudei de mesa, posicionei alguns objetos de outra forma, enfim. Hoje o cotidiano parece bem melhor. E eu sei que posso mudar de ideia depois, mas o importante é perceber que as mudanças que fiz deixaram o meu espaço melhor do que estava antes.
Encontrar pequenas formas de deixar o dia mais bonito, como sentir mais o gosto do café quentinho, colocar flores do lado da mesa para admirá-las a qualquer hora, ter sempre um caderno por perto e encarar as páginas em branco como um espaço aberto para deixar a poesia transbordar tem me feito mais feliz com o inerente movimento do tempo.
Por mais simples que pareça experimentar outras possibilidades de roupas ou de organizar os móveis, habitar esse lugar novo que acontece à medida que você decide atentar para outras brechas pode ajudar a ver as coisas por outra perspectiva.
Mudar nem sempre é agir por impulso e testar coisas que você nunca faria, dizendo sim para tudo, mas ter a coragem de saber dizer "não", entender os seus limites, fechar os olhos para enxergar o que você talvez não tenha conseguido ver ainda e, assim, analisar os caminhos possíveis para continuar indo além ou se aproximar mais do que você deseja para si.
Nessa jornada, cada uma das mudanças que vivenciamos são uma infinidade de partes nossas que se transformam de modo transitório, cíclico, se moldando em uma nova forma de existência e reunindo outras cores, feito uma colcha de retalhos.
o que tenho visto por aqui
🎞️ Vi Marte Um no cinema e, com certeza, foi o filme que mais me fez chorar nesse ano. O filme foi pré-selecionado para representar o Brasil no Oscar e, por meio de imagens afetivas de uma família brasileira que passa por diversas mudanças internas e externas, o diretor Gabriel Martins nos leva a mergulhar em uma história cheia de nuances pessoais, políticas e familiares.
É possível perceber como as escolhas e os caminhos percorridos por cada um dos integrantes da família pode transformar não apenas a vida no aspecto individual, mas coletivo, e como esses laços vão se alargando, aproximando e tornando outras dimensões visíveis. A cena do diálogo entre os irmãos, Eunice e Deivinho, antes de dormir, foi uma das que mais me emocionou.
O final do filme enche os nossos olhos de esperança para além do que vemos na tela. A história do filme alinhava questões de desigualdade social, preconceito, futebol, relacionamento, trabalho, exploração espacial, realidade e sonho. Uma das coisas mais lindas da narrativa é ter a possibilidade de rir, chorar, refletir, se emocionar e sentir a vontade de ver de novo.
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⭐ Obrigada por ler até aqui! Um beijo e até a próxima quarta :)
Oi! Me vi muuito nesse texto. Parece que a cada mês as coisas vão mudando sutilmente e sempre acaba refletindo no exterior - também chamado de faniquito pra mudar o quarto todo kkk
Também sinto que muita coisa não me cabe mais, e essa mudança veio principalmente depois dos 30.