[fotografia de Alessio Albi]
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Se você já teve a oportunidade de comprar um livro em sebo, provavelmente já se deparou com recados, marcações, rabiscos ou dedicatórias de outras pessoas, e essa é uma das melhores coisas de adquirir objetos usados. Observar os vestígios, para além das marcas do tempo, também é uma forma de se aproximar de memórias quase invisíveis.
Os desenhos realizados nas cavernas, a criação de um alfabeto e as múltiplas mídias para contar histórias são algumas das formas que a humanidade encontrou para deixar pegadas pelo meio do caminho.
As linhas das nossas mãos contam histórias e podem gerar outras linhas de narrativas para quem está no presente e quem ainda está por vir.
Na semana passada, minha sogra me mostrou um retrato em sépia do seu pai, que trazia uma declaração afetuosa para a mãe dela no verso. As palavras acompanham uma data de 61 anos atrás e ainda encantam os olhos de quem vê e pode lembrar, criando novas imagens e outros cenários para o que aconteceu.
Naquele tempo, era comum escrever pequenas cartas de amor por detrás das fotografias impressas e presentear pessoas queridas com o registro da imagem e das palavras.
Minha mãe guarda, com muito carinho e cuidado, a herança de pequenas toalhas bordadas e caminhos de crochê, que minha avó fez. Pelas linhas que ela teceu com maestria, sua presença continua viva entre nós.
Por meio de cartas, um romance do passado ainda pode inspirar um futuro a dois. Pelos objetos têxteis, diversas tramas podem ser entrelaçadas ao longo dos anos. Pelos ingredientes e modo de fazer registrados, em um caderno de receitas antigo, uma família pode preparar refeições e sentir o aroma experienciado há diversas gerações.
A memória do passado se faz presente pela textura de papéis, palavras, desenhos, linhas e tecidos que abrem novas possibilidades de narrativa e experiência. Quais são os rastros que você tem criado com as suas mãos? Qual atividade manual tem feito parte da sua rotina e pode partilhar memórias no amanhã?
o que tenho visto por aqui
📚 Li iô, de Camila Lourenço, que é uma história contada em forma de poesia, muito fluida e ao mesmo tempo muito forte, feito vento que passa rápido, segue um ritmo e também pode mudar algumas coisas de lugar.
📚 Comecei a ler Carne de mãe, de Mell Renault, e o que posso dizer até então é que estou lendo devagarinho, em doses homeopáticas, como a Carla de Paiva falou. O livro fala sobre a relação conflituosa entre mãe e filha, de uma forma muito profunda e sensível, trazendo também as questões da trajetória de mulheres, de luto e ausência no tempo passado e presente. Deixo aqui um dos trechos que já grifei:
Nós duas numa estação. Não sei quem chega e quem parte, porque morre também a filha, quando morre a mãe. Sei que nos desencontramos. Nossos caminhos sempre bifurcando, nossa sempre separação, como agora.
Mell Renault
🎞️ Assisti ao filme Os primeiros soldados, dirigido por Rodrigo de Oliveira, no cinema e, meu Deus, que filme lindo (!!!!) A obra aborda a questão do início da AIDS no Brasil; do corpo que sangra e ainda é capaz de criar imagens, performance, amor; da fragilidade humana; dos afetos que são criados como forma de resistência diante de um cenário sem perspectiva, e de uma existência que se perpetua para além da presença física. A narrativa poética, a beleza das cenas e a trilha sonora, produzida por Giovani Cidreira, são motivos a mais para ver e se emocionar.
outras ondas
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um beijo e até mais!
"Não sei quem chega e quem parte, porque morre também a filha, quando morre a mãe."... bah! Vou levar comigo pra pensar, obrigado por compartilhar! Lembrei da Mafalda dizendo que ela e a mãe se graduaram no mesmo momento – mas nunca havia pensado que elas também se formam juntas. 😅
Que lindeza de news ❤️🔥 amei ver o Literapia ali no meio de tantos tesouros! Muito obrigada 🥰